Você está aqui: Capa » Publicações » A Constitucionalidade da Usucapião de Bens Públicos

A Constitucionalidade da Usucapião de Bens Públicos

Há quase 3 anos defendi minha monografia na Universidade Católica de Brasília e escolhi um tema árduo e de difícil aceitação, que foi tratar dos efeitos da ocupação dos bens públicos por particulares ao longo do tempo, concluindo pela possibilidade jurídica da usucapião desse bens.

(http://repositorio.ucb.br/jspui/bitstream/10869/2899/1/Michelle%20Carneiro%20da%20Silva.pdf)

A dificuldade da defesa se deu pelo fato de a Constituição Federal expressamente proibir a usucapião de bens públicos e os aplicadores do Direito se apegarem a esta regra como um náufrago se apega a um pedaço de tábua achada no alto mar.

Em que pese tal vedação, a CF, que também garantiu o direito de propriedade, estabeleceu como condição precípua de proteção a este instituto (da propriedade) o exercício da função social, ou seja, a propriedade para receber a proteção do Estado necessita (indubitavelmente) ter utilidade social.

Para que serve ter um terreno onde ninguém vive ou produz? Ou um imóvel abandonado que, além de não ser usado positivamente, ainda prejudica a sociedade como esconderijo de criminosos ou de usuários de drogas?

Apesar de parecerem lógicas as respostas dessas perguntas, não são.  Vez que os aplicadores do Direito, em sua grande maioria, são legalistas, presos à literalidade de textos legais. Mais ainda se o texto estiver na Constituição.

O estudo foi penoso (em que pese me identificar muito com o que eu tratava) porque não havia na doutrina (até onde pesquisei!) nenhum jurista que defendesse de forma direta o que eu defendia, então, parecia muita ousadia de uma formanda pensar (e defender) algo que era refutado ou, no mínimo, omitido, pela grande maioria dos pensadores do Direito do Brasil.

Mas a vontade de seguir a minha crença jurídica e de mostrar outra possibilidade interpretativa me levaram a seguir na defesa e conseguir nota máxima da banca examinadora.

Entretanto, restava a sensação de que não passava de um texto bem escrito e com coerência, mas sem nenhuma eficácia social.

Até que….

Em junho do ano passado tive conhecimento da propositura da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 270/2013, que visa “garantir direito de propriedade por usucapião de imóveis urbanos públicos ocupados há mais de dez anos sem contestação do Poder Público”.

(http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=1C4BB31AB1BA0B84695B34698E9BD62A.node2?codteor=1096316&filename=Tramitacao-PEC+270/2013)

Recentemente o Tribunal de Justiça de Minas Gerais “admitiu a usucapião de bem público” mantendo a sentença em que o Juiz indeferiu o pedido do Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER-MG), que solicitava a desocupação de uma área pública estadual de 36 mil metros quadrados, onde residem cerca de dez famílias, instaladas no local há cerca de 30 anos. Além de conceder ganho de causa em 1ª Instância aos moradores, o magistrado declarou o domínio das famílias sobre a área ocupada.

(http://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/noticias/136657712/decisao-do-tjmg-no-caso-que-admitiu-a-usucapiao-de-bem-publico?utm_campaign=newsletter-daily_20140901_47&utm_medium=email&utm_source=newsletter)

Essas vitórias homeopáticas mostram que os juristas brasileiros começam a se aperceber de que houve uma mudança de eixo e nenhum direito é absoluto. É a relativização das regras pelo uso dos princípios como contrapeso que transforma a atuação jurisdicional em medida justa.

O Direito evoluiu e incorporou ao seu conceito de eficácia outros valores, dentre os quais a moralidade, e permitir que o Estado sucateie o patrimônio público albergado pela intangibilidade de seus bens é bem mais que ilegítimo, é imoral (e agora começam a perceber que também o é inconstitucional).

Portanto, o reconhecimento da usucapião de bens públicos é plenamente possível e constitucional.

Michelle Carneiro

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Required fields are marked *

*

Você pode usar estas tags e atributos de HTML: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <strike> <strong>

Scroll To Top